Análise da
propaganda Super 8 Motel
“Nossos clientes
que se fodam”
Adson Moreira ¹
Fabiane
Ferreira
Ludemberg Dantas
Robério Pereira Barreto
²
Resumo: Esse artigo
propõe a análise da propaganda do Motel Super 8, de autoria de Ivan Malusá
Romanini no contexto interpretativo de múltiplas visões partindo da frase
“Nossos clientes que se fodam” e “Honestidade. Algo que a empresa tem e que
metade de seus clientes não.”. Essa análise também tem como base o ethos
discursivo, princípios sociais e discursos constituintes referentes à religião
no que se refere à honestidade/fidelidade.
Palavras-chave:
Propaganda, contexto, honestidade, discurso, analise, religião e fidelidade.
1. Introdução
Este artigo discute o
sentido da palavra no texto publicitário, sabendo-se que: “(...) todo ato de
enunciação é fundamentalmente assimétrico: a pessoa que interpreta o enunciado
reconstrói seu sentido a partir de indicações presentes num enunciado produzido”. ³
Dessa forma cada
enunciado tem sentido atribuído pelo enunciador, sendo decifrado por um
enunciatário que dispõe do mesmo código, que fala a mesma língua, mas isso não
significa que a enunciação coincida com a intencionalidade do enunciador.
Para entender um
enunciado é necessário mobilizar saberes muitos diversos e não podemos
analisá-los semanticamente fora de um contexto, pois os enunciados assumem um
lugar em um momento especifico.
_________________________
¹ Discentes do Curso de Letras, turma
2009.2, Universidade do Estado da Bahia - Departamento de Ciências Humanas e
Tecnológicas - Campus XVI – Irecê – BA. adsonkm@gmail.com,
fabianemedusa@yahoo.com.br, ludembergpereira@hotmail.com
² Doutorado do Programa de
Pós-Graduação em Educação, da PPGE da Faculdade de Educação – FACED/UNEB, Linha
2 Filosofia, Linguagem e Práxis Pedagógica. Mestre em Educação docente,
Currículo e Tecnologias intelectuais, da Universidade do Estado da Bahia – UNEB
– Campus I – Salvador – Ba. Professor do curso de Letras e Pedagogia da UNEB –
Campus XVI – Irecê – Coordenador do Núcleo de Linguagem e Tecnologias do
Ciberespaço do Campus XVI – Irecê. jpgbarreto@gmail.com
³ MAINGUENEAU, 2005, p. 20.
2.
O
discurso do humor
Na atualidade o
discurso do humor e o código no qual se engendra estão disseminados por todas
as esferas sociais, estando presentes e permeando os mais diversos discursos
como: o da publicidade; o da moda; o da indústria cultural; o do meio político;
as manifestações da sociedade civil, as obras de arte, etc. Enfim, o humorismo
passou a ser um dos principais mediadores das relações com os outros e com o
mundo. 4
O humor tem seus
sentidos e propósitos primordiais esvaziados, pois se em outros tempos estava
ligado ao escárnio, à crítica ácida e agressiva, ao riso zombeteiro e ao
discurso não oficial, na atualidade o humor acaba por se tornar instrumento do
esvaziamento tão em voga no contemporâneo. As ideologias, as posições e
discursos são neutralizados pelos gracejos lúdicos e divertidos tal como apontado.
Além disso, o discurso do humor contemporâneo é caracterizado principalmente
por ter se tornado produto para consumo individual, isto evidentemente se
seguir certos padrões, ou seja, para ser aceito deve estar submetido a certas concessões,
se adequando à superficialidade de um consumo fácil, assimilando um tom
politicamente correto e assumindo um caráter light, leve, eufórico, cool
e fun.
Já o humor
politicamente incorreto seria uma forma de humorismo diametralmente oposta
àquele praticado e veiculado no contemporâneo, dentre outros fatores, por estar
em consonância com características expressivas e inerentes deste gênero da
linguagem. De modo geral, podemos dizer que o humor sempre foi caracterizado
por um forte viés “negativo”, ou seja, caricatural, ácido, grotesco,
escatológico, iconoclasta, etc. o qual é facilmente identificável no humor
politicamente incorreto. Embora este tipo de humor fuja ao praticado e ao
padrão em nossa sociedade, classificada por Lipovetsky (2005) de sociedade
humorística, aquele se faz presente em diversas manifestações culturais ou
políticas, como nos desenhos animados, nas charges, nos blogs, etc.
________________________
4 JUSTO,
2006, p. 103-112
- Enunciação na propaganda Super 8 Motel
O enunciado pode
ser pragmático quando mostra de uma maneira ou de outra, valor pragmático, o
ato que deseja realizar por intermédio de seu enunciador. Então as condições
materiais de apresentação interferem no sentido. A propaganda do Motel Super 8
ganha pragmatismo quando mobiliza o conhecimento dos hábitos sociais colocando
nas paredes cartazes de valor pratico onde o enunciatário deve identificar no
enunciado a intenção de significar o que ele significa de entender a
intencionalidade do texto.
Com relação ao
contexto, primeiramente, Maingueneau o define como “seqüências verbais
encontradas antes ou depois da unidade a interpretar”. 5
Dessa forma o texto publicitário do Motel Super 8 deve ser entendido como um
enunciado pragmático (expressa uma finalidade cheia de intencionalidade) e o
texto “nossos clientes que se fodam” não pode ser analisado sem a referencia
“Super 8 Motel”, pois perderia o sentido.
Isso significa que o
enunciatário certamente terá que analisar o contexto levantando hipóteses para
explicar as proposições implícitas principalmente da palavra “fodam”, que no
sentido apresentado faz menção ao que o cliente fará dentro do motel e não se
trata de um insulto, impressão que se tem ao abordarmos o texto separadamente.
Esse tipo de propaganda
deve ultrapassar o limite de uma mera piada e também deve ser adequada a
linguagem de propaganda, como se de fato pudesse vender o produto.
___________________________
5
MAINGUENEAU, 2005, p. 27.
4.
O
Ethos da propaganda
Partindo para o “ethos”
de que “toda fala possui “um enunciador encarnado”, ao analisar esse ethos
podemos observar que ele precisa de uma representação que reesignifique o
enunciado de quem fala, de onde fala e analisar se essa voz é de alguém que
entende do assunto que freqüenta motel, e que certamente precisaria de uma
comunicação rápida, levando em
consideração que “os casais” não estariam ali para perderem tempo, portanto a
linguagem informal, diria em poucas palavras o que eles querem de fato, sem se
preocuparem com o duplo sentido , já que a propaganda é de um motel. Desse
modo, uma comunicação simultânea.
Caso a frase fosse
empregada por uma propaganda de supermercado por exemplo, “nossos clientes que se
fodam”, certamente esse supermercado não teria nenhum cliente, pois automaticamente a frase
teria outro sentido, que nesse caso representaria de fato um xingamento, afronta
colocando assim o cliente distante da empresa. “Em geral o individuo que fala e
se manifesta como ‘eu’ no enunciado é também aquele que se responsabiliza pelo enunciador”.
Todavia existe uma
maneira mais simples do enunciador se desresponsabilizar pelo discurso, é
quando ele se apóia em outro discurso “modalização em segundo discurso” em que
podemos tomar como exemplo:
a França segundo
fontes bem informadas prepara uma represália, ou seja, o segundo discurso se
apóia num sujeito oculto retirando quaisquer responsabilidade em relação a
autoria do discurso.6
Já o ethos possui um tom que dá
autoridade ao que é dito. Esse tom permite a construção desse enunciador da um
corpo para essa voz. Voltando para a análise da propaganda do Motel Super 8,
podemos observar logo abaixo da frase principal o fechamento dos discursos com
uma outra mensagem que diz o seguinte: “Honestidade. algo que a empresa tem e
que metade de seus clientes não”. A sinceridade atribuída ao discurso reforça a
ideia de honestidade da empresa, levando em consideração que nem todas as pessoas,
clientes são honestas.
Em uma analise a
“grosso modo”, nos parece que todo tempo a propaganda do motel tem a intenção
de tirar o cliente do sério, de afrontá-lo e ate mesmo de duvidar de
____________________________
6
MAINGUENEAU, 2005, p. 139.
sua honestidade. Outra forma de
interpretação mais minuciosa permitiria uma análise mais cabível em relação a
“essa não honestidade da metade dos clientes”, poderia referir-se a supostas
traições de casais que usam o motel como refugio de práticas extraconjugais, ou
ainda para praticarem homicídios.
Toda a ideia de
honestidade, fidelidade, parte de princípios religiosos sustentados em
paratopias relacionados ao casamento que tem como slogan: “ate que a morte os
separe”. É valido observar que todo o discurso de ordem romântica ultimamente
não tem se sustentado.
- Intertextualidade
“Intertextualidade diz
respeito aos modos como a produção e a recepção de um texto dependem do
conhecimento que se tenha de outros textos com os quais ele, de alguma forma,
se relaciona” 7.
Partindo desta definição geral, podemos afirmar a alta relevância que tem no
cômico, uma vez que, principalmente nas relações em que estabelece com outros
textos é que residem os sentidos que provocam o riso.
O discurso só
adquire sentido no interior de um universo de outros discursos, lugar no qual
ele deve traçar seu caminho. Para interpretar qualquer enunciado, é necessário
relacioná-lo a muitos outros – outros enunciados que são comentados,
parodiados, citados, etc. 8
- Parodia
e Sátira
Parodia e sátira são
mecanismos intertextuais muito utilizados nos textos cômicos. Os dois termos
não são sinônimos, entretanto carregam algumas características semelhantes. De
modo geral, podemos dizer que em ambas há um texto primeiro na qual se baseiam
e se referem de modo caricato e irônico, contudo ou o novo texto produzido será
repetido com diferença, como no caso das paródias, ou será criado a partir da
crítica de alguns elementos presentes no texto base, como temos na sátira.
A paródia é,
pois, na sua irônica “trancontextualização” e inversão, repetição com
diferença. Esta implícita uma distanciação crítica entre o texto em fundo a ser
parodiado e a nova obra que incorpora, distância geralmente assinalada pela
ironia. Mas esta ironia tanto pode ser apenas bem humorada, como pode ser
depreciativa. 9
___________________________
7 KOCH, 2000, p.
46.
8 MAINGUENEAU,
2008, p. 55.
9 HUTCHEON (1989,
p. 48)
5. Texto e Discurso
O
texto apresenta uma sistematização do que a linguagem é capaz de oferecer ao
seu leitor. No decorrer de uma leitura, existem várias possibilidades de nos
depararmos sempre com conceitos de conceitos, isso nos leva a adquirir informações
capazes de significar os enunciados, havendo um entendimento com o que vem a
ser apresentado, de forma prática ou detalhada.
O
leitor parte de uma existência literária desde tempos passados. Presentes nos
mais diversos tipos de leitura, o leitor ativo passa a ter com as palavras novas
formas de ir em busca pela informação, onde o significado surge sempre com a
possibilidade de oferecer alternativas e caminhos a novos passos, novas
descobertas e idealizações.
O
texto só interessa agora como operador de leitura visto dentro de um contexto
pragmático de interpretação, que é tanto o do espaço universitário quanto o de
seu entorno, de alguma forma o “mundo”, hoje em sua fase de globalização ou de mondialisation, como se diz em contexto
francês. 10
Remetendo a uma visão
do que uma ideia significa, o texto se classifica também como um “idealismo
pensante”, onde tudo ou nada pode vir a acontecer. A força de um texto está
presente nas mais diversas formações ideológicas, onde novos contextos, a
organização dos signos linguísticos trazem a necessidade de inserção a novos
textos juntamente com o diálogo, onde “o discurso fala o que as palavras
significam”.
O
foco principal é falar do discurso, no nível do “já dito”, permanecer no
ambiente em que a manifestação da alteridade de cada ato discursivo, afirmando
que o objetivo do método arqueológico é “definir não os pensamentos, as
representações, as imagens, os temas, as obsessões que se ocultam ou se
manifestam nos discursos, mas os próprios discursos enquanto práticas que
obedecem a regras.” 11
Sendo assim, o texto
vira discurso e o vice-versa. Michael Foucault, estudioso da Análise do
Discurso, apresenta a formação discursiva em um aspecto de envolvimento do
intelectual para a desconstrução de verdades, onde muito se vê nas suas
afirmações a construção e desconstrução da palavra, tendo-a como uma forma de
poder.
_________________________
10
Uma reflexão recente sobre o lugar da universidade na sociedade contemporânea
se encontra em L’Université sans condition (2001), que se traduziu em a Ed.
Estação Liberdade (2003).
11
FOUCAULT, 1986, p.182-183
6. Considerações
Levando
em consideração o estudo de um discurso paratopico, onde existem a inclusão e
exclusão de um significado por parte do enunciado, devemos ter em mente o
discernimento em analisar cada texto. Assim se faz a Análise do Discurso que,
no seu processo de busca pela informação, pela concretização da palavra, nos
garante participar da intelectualidade a qual estamos inseridos a cada instante
no decorrer de nossas leituras, compressões e compartilhamento dos signos
linguísticos.
As
particularidades dos discursos nos possibilitam a compreensão dos enunciados em
termos publicitários, uma vez que “o grande lugar da paratopia é a literatura,
depois a publicidade”. Com isso, as demais publicidades e o exemplo em questão,
quando apresentados como anúncio em defesa de um comércio, são propositais a
uma invasão de busca pela lucratividade, no momento que o dito e o visto, são
fundamentais para despertar atenção e adquirir meios a outros destinos,
satisfatórios ou não.
Percebemos a múltipla
ideia que a publicidade “Nossos clientes que se fodam” possibilita em uma
leitura corrida, caso não seja identificado o local do anúncio, que no caso em
questão é referente a um Motel, e ai sim o sentido “se faz jus”.
7. Referências Bibliográficas
FOUCAULT, Michel. A Arqueologia do Saber. Tradução de Luiz Felipe Baeta Neves,
revisão de Ligia Vassalo. Petrópolis: Vozes, Lisboa: Centro do Livro
Brasileiro, 1972. 260p. [Edição Original publicada em 1969].
JUSTO, José Sterza. Humor, educação e
pós-modernidade. In: ARANTES, Valéria Amorin. (Org.). Humor e Alegria na Educação. São Paulo: Summus, 2006. p.103-112.
LIPOVETSKY, Gilles. A sociedade
humorística. In: A era do vazio. Trad. Therezinha Monteiro Deutsch. Barueri: Manole,
2005. Cap. 5.
MAINGUENEAU, Dominique. Análise de textos de comunicação. Trad.
Cecília P. de
Souza-e-Silva e Décio Rocha. São Paulo:
Cortez, 2008.
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