sábado, 18 de fevereiro de 2012

“A sociedade do olhar” (Lúcia Helena) e “O narrador pós-moderno” (Silviano Santiago)


“A sociedade do olhar” (Lúcia Helena) e “O narrador pós-moderno” (Silviano Santiago)


Ludemberg Pereira Dantas

A literatura, presente na vida de todo homem, apresenta funções que determinam a continuidade de uma existência significativa das palavras e suas formas. Na contemporaneidade, a literatura brasileira é o reflexo de uma capacidade no fazer pensar.

A escritora Lúcia Helena, em seu texto “A sociedade do olhar”, convida o leitor a se posicionar com a ficção, relacionando um determinado acontecimento com uma possibilidade. A imagem é referência da autora, quando transpõe a ideia de que a linguagem, seja ela visual, sonora, transmitem significações levando a pensamentos e lembranças.

Com sabedoria, o homem passa a “rever” suas possibilidades e experiências, como sujeito. Daí a imaginação entra em jogo, quando até então aquilo representado foi fruto de uma necessidade, talvez imposta pela sociedade, onde o homem participou como um personagem, que viveu seu momento de satisfação ou “engano”, levando-se a se questionar ou a calar-se. Exemplo dessa reflexão está presente na fotografia: ela registra cenas das quais trazem lembranças e até afirmações do que foi vivido no passado.

Silviano Santiago, em seu texto “O narrador pós-moderno” traz conceitos de que a narrativa pós-moderna representa para a literatura uma praticidade do que seja contar uma história. De início, o autor faz uma distinção entre os diferentes tipos de narração, classificando-as em narração clássica, romântica, jornalística, contemporânea. Essa diversidade significa que tanto o escritor como o narrador se permitem a irem além de suas imaginações, a partir do momento que a comunicação é uma arte que faz pensar.

Portanto, a literatura brasileira contemporânea permite que a sociedade e o sujeito atual se percebam como partes de um processo, onde a transformação sempre estará presente em todos os momentos de uma vida, seja na esfera sentimental, racional; um novo conceito sempre existirá e as possibilidades continuarão.

16/12/2011

Leite Derramado (Chico Buarque)


Leite Derramado (Chico Buarque)


 Ludemberg Pereira Dantas

Chico Buarque de Holanda, cantor e compositor brasileiro, publica o livro Leite Derramado em 2009, uma narrativa amorosa que faz uma crítica à sociedade do século XX, com uma visão extremamente pessimista de um povo corrupto, preconceituoso na classe, na cor e na sua história.

O livro é o resultado de um escritor que se encontrava em um dos seus melhores momentos com a linguagem, abordando diversas temáticas em um volume onde os capítulos não receberam títulos e nem ordem cronológica. A história é narrada por um centenário, no leito de um hospital público, lugar onde passa a contar suas memórias para a sua filha e às enfermeiras.

Eulálio, homem de uma família da elite, da corte portuguesa é a representação de um fracassado, que tinha por Matilde toda uma esperança de um amor não correspondido. A narrativa apresenta-se carregada de uma linguagem que faz tanto o autor como o leitor se envolverem nas temáticas, quando apresenta a memória como sendo personagem principal, tendo assim, a oportunidade de levar a ficção juntamente com a narrativa clássica, contemporânea.

O autor demostra o seu desejo em tratar de um preconceito, quando em Matilde é criada um branqueamento por parte de Eulálio, que nega sua situação econômica atual por ter feito parte de uma família rica no passado, que tem no país uma corrupção na politica, na economia, com destruição na natureza, para a satisfação de moradias luxuosas, como exemplo de sua mansão em Copacabana.

Assim, é criada uma narrativa que leva um contexto a questões de discussão contínua, onde um dos objetivos do autor é apresentar uma literatura capaz de fazer o homem pensar seus valores morais, éticos, sociais, para que assim, surjam novas concepções. 
16/12-2011

Luís de Camões

 Luís de Camões (1524-1580)


Transforma-se o amador na cousa amada,
Por virtude do muito imaginar;
Não tenho logo mais que desejar,
Pois em mim tenho a parte desejada.

Se nela está minha alma transformada,
Que mais deseja o corpo de alcançar?
Em si somente pode descansar,
Pois com ele tal alma está liada.

Mas esta linda e pura semideia,
Que, como o acidente em seu sujeito,
Assim como a alma minha se conforma,

Está no pensamento como ideia;
E o vivo e puro amor de que sou feito,
Como a matéria simples busca a forma.

Ludemberg Pereira Dantas

Luís Vaz de Camões, em referência ao soneto: “Transforma-se o amor na cousa amada”, eleva a sua visão de poeta que se classifica como um dos grandes pensadores da humanidade, fazendo presente a exaltação da mulher amada. O texto, distribuído em dois quartetos e dois tercetos, apresenta versos decassílabos e rimas //ABBA//ABBA//CDE//CDE//. No primeiro verso é perceptível o tema Amor, aonde o “eu lírico” é levado pelo romantismo do poeta.

A lírica amorosa de Camões, no soneto citado, exalta a mulher em uma perspectiva idealizada. O amor de uma mulher que Camões nunca possuiu, mas pensou. O amor ideal e ao mesmo tempo irreal. É presente em todo o seu pensamento, a “grandeza” do homem quem o foi na sua existência. Idealizava não a mulher da Corte, a dama, a bem-amada, mas o seu reflexo, o imaginário, criando ao contrário do amor possível, um amor platônico, longe de uma possibilidade, mas presenta no seu desejo.

Um amor capaz de corresponder o que a alma tem a transmitir de sincero, único, “divino”: “Pois com ele a alma está liada”. Assim, Camões “cria” a mulher dona do amor verdadeiro, com a ideia longe do possível de uma existência em matéria, mas presente na alma: “Assim com a alma minha se conforma”.

Partindo do pensamento de Platão, Camões o tem como grande referência a toda uma vida. A estética renascentista  com a qual o soneto faz relação, seja a matéria (como exemplo do corpo humano), ou uma pedra, até à alma (como algo divino), Camões pensa o Renascimento na visão de que tudo re-nasce, e o amor então, nunca terá o seu fim: “E o vivo e puro amor de que sou feito”.

O último verso do soneto: “Como a matéria simples busca a forma”, corresponde a um fim como início. Todo esse percurso que Camões apresenta, sua forma, sua visão racionalista, sentimental, amorosa, expressam a necessidade diante ao seu lugar como humano, capaz de amar a matéria e se permitir também ao amor da alma, mesmo diante das impossibilidades impostas pelo mundo, como o pecado, por exemplo, mas acreditar “assim como Camões” em um amor possível, possibilitando a todos viverem melhor.

14/12/2011